4 de jun. de 2013

Mulheres do Ceasa em poesia

Uma poesia pode trazer à mente a lembrança das idas aos Domingos à feira do CEASA (CEAGESP - Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo).

O que me vem à lembrança são as mulheres que aguardam o fim da feira ou as mulheres que no meio do tumulto ficam pedindo um trocado para comprar frutas, verduras ou legumes. Em minha lembrança não houve uma única vez que não vi tal cena, mesmo eu sendo costumeiramente obrigado a ir até lá a cada duas semanas. É o meu martírio dominical quinzenal.

Essas mulheres, algumas vezes a sós, ou acompanhadas de seus filhos ranhentos e mulambentos, se comportam como na poesia da Angélica Freitas que tirei de seu provocativo e também sensível livro "Um útero é do tamanho de um punho" (Cosac Naify, 2012).

Parece que ninguém gosta de vê-las, presumo até que ninguém as vê mesmo, afinal, quem quer ver uma mulher suja? Preferem apreciar as belas folhas verdes do espinafre, o brilho amarelado dos pimentões, o vermelho forte do tomate italiano ou sentir o perfume adocicado dos setores de frutas ou das flores.

Quem sabe através da poesia as pessoas voltem a ter amor ou ao menos, tenham a virtude de fazer de conta que amam (sobre isso, vale a pena a leitura da introdução do livro do André Comte-Sponville, "O amor").

Enfim, é a lírica copiando a realidade ou a realidade copiando a lírica? 

Recomendo a leitura do poema abaixo, e claro, uma visita ao Ceasa.





é o poema da mulher suja
da mulher suja que vi na feira
no chão juntando bananas
e uvas caídas dos cachos

tinha o rosto sujo
as mãos imundas
e sob as unhas compridas
milhares de micróbios

e em seus cabelos
longos, sujos, cacheados
milhares de piolhos

a mulher suja da feira
ela mesma uma fruta
caída de um cacho

era frugívora
pelas circunstâncias

gostava muito de uvas
mas em não havendo uvas
gostava também de bananas